Ônibus “Acessível” e “Euro 6”: Por que a obrigatoriedade legal anula o status de “avanço tecnológico”

Ao anunciar a compra de novos ônibus, empresas e administrações públicas frequentemente destacam a presença de motores Euro 6 e a acessibilidade para pessoas com deficiência (PCD) como grandes avanços e benefícios. Contudo, do ponto de vista jornalístico e técnico-legal, a inclusão desses itens reflete o mero cumprimento de obrigações legais vigentes no Brasil, e não uma inovação tecnológica voluntária.

Acessibilidade: Um Direito Cidadão e uma Obrigação Antiga

A acessibilidade no transporte público não é uma benfeitoria, mas um direito fundamental estabelecido por legislação federal:

  • Fundamento Legal: A Lei Brasileira da Inclusão (LBI) — ou Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei n° 13.146/2015) — assegura o direito ao transporte e à mobilidade em igualdade de oportunidades.
  • Acessibilidade Obrigatória: O poder público é obrigado a garantir que os serviços de transporte coletivo, incluindo os veículos e os terminais, sejam acessíveis.
  • Obrigatoriedade Histórica: A legislação sobre acessibilidade em transportes foi progressivamente imposta, com o Estatuto da Pessoa com Deficiência reforçando a obrigatoriedade para as empresas de transporte, tornando a plataforma elevatória, por exemplo, um item obrigatório há anos.

Portanto, um ônibus ser anunciado como “acessível para PCD” significa apenas que o operador está em conformidade com a legislação que visa eliminar barreiras, e não que está oferecendo um diferencial de mercado ou um avanço notável.

Motor Euro 6: Um Padrão Mínimo de Emissão de Poluentes

O motor que segue a norma Euro 6 é obrigatório para veículos pesados no Brasil e representa o padrão mínimo exigido para controle de emissão de poluentes.

  • Obrigatoriedade no Brasil: O padrão Euro 6 — conhecido no país como PROCONVE P8 — entrou em vigor no Brasil em 1º de janeiro de 2023 para todos os veículos novos pesados.
  • O que é o Euro 6: É um conjunto de normas que exige dos motores a diesel a redução drástica de gases poluentes, como o óxido de nitrogênio e material particulado, por meio do uso obrigatório de tecnologias como a Redução Catalítica Seletiva (SCR) e, em alguns casos, a Recirculação de Gases da Exaustão (EGR).
  • Atraso em Relação a Outros Países: Embora seja um avanço tecnológico em relação ao padrão anterior (Euro 5 ou PROCONVE P7), a adoção do Euro 6 no Brasil ocorreu anos depois da Europa (onde estava em vigor desde 2013) e de outros países latino-americanos, como Chile e México, que adotaram padrões rigorosos antes de 2020.

Anunciar um ônibus como “tecnologia Euro 6” não configura um avanço voluntário do operador, mas sim a aquisição de um veículo que cumpre a legislação de fabricação mais recente, sem a qual ele não poderia ser licenciado e vendido no país a partir de 2023.

Em resumo, a presença de itens de acessibilidade e de motores Euro 6 em novos ônibus deve ser tratada como o mínimo legal esperado e não como um destaque meritório ou um grande avanço tecnológico por parte dos operadores do transporte.